sábado, 5 de janeiro de 2008

COMIDA DE PRAIA

Aquelas ondinhas que vão, vêm e batem na praia, o cheirinho de maresia, um mar maravilhoso, um sol de rachar, tudo pura energia. Mas praia é também um bom tanto de sombra e de água fresca, é jogar as havaianas de lado, deitar na rede com uma roupa gostosa para ler um livro emocionante, é tomar água de coco, é bater um papo mole, e é comer uma comidinha gostosa, descontraída, colorida e com jeito de férias e, é claro,
de mar. Na cozinha, nada pode ser trabalhoso ou exigir muito esforço, as receitas têm que ser práticas, rápidas e charmosas, pois a palavra de ordem é descanso. Há que se aprender a usar a noite ou o tempo da ida à praia para deixar alguma coisa marinando ou gelando, e aproveitar os momentos de mais disposição, ou quando já se está com as mãos na massa, para adiantar o que for possível para a refeição seguinte. E por falar em refeição seguinte, eu sinceramente não caio mais naquela história de que se todo mundo volta da praia tarde e almoça por volta das 4 ou 5 horas, não é preciso pensar em jantar. A verdade é que, por volta das 9 ou 10 da noite, uns começam a dizer que bateu uma fomezinha, vem o abre e fecha da geladeira, uns querendo esquentar alguma coisa, outros olhando a despensa atrás de algo interessante e o fato é que cada um acaba se virando como pode, sem muita lógica e, às vezes, com muita confusão. Para resolver o problema de todo mundo, percebi que, além do café-da-manhã e do almoço, a melhor saída é propor de uma vez uma refeição mais leve, normalmente uma salada ou algum outro prato único também refrescante, uns pães, queijos, pastas, frios e frutas.As receitas que escolhi têm toda a cara de verão, mas acabam servindo para o ano inteiro, pois, nessa terra em que o sol quase não desaparece, mesmo no inverno, quando a água está mais fria, aquele solzinho mais baixo continua aquecendo e deixando a praia deliciosa. Elas têm ares brasileiros, caribenhos e do sudeste asiático, usando e abusando de ervas frescas, coco, laranja, limão, pepino, tomate, iogurte, peixes, camarões, lulas e polvos.Falando nos ingredientes, dizer que o importante é começar com peixes e crustáceos de boa qualidade pode parecer conversa de sempre, mas, para tudo o que vem do mar, o frescor é mais do que essencial e é fundamental ter um bom fornecedor, que tenha comprado os seus peixes e crustáceos de uma empresa de pesca que, ainda no próprio barco, tenha tido os cuidados básicos de limpar e resfriar ou já congelar tudo direitinho (na prática, um peixe bem congelado é muito melhor e mais fresco que um recém pescado que foi guardado de qualquer jeito).É claro que é melhor consumir um peixe pescado no mesmo dia, ultra fresco, mas isso, infelizmente, acontece cada vez menos. É o máximo tanto pescar o seu próprio peixe, como ver o barco do pescador sair da água, parar na areia, olhar a rede, escolher o peixe ainda vivo e levar para casa (às vezes, isso ainda acontece em Toque-Toque Pequeno, em São Sebastião, onde fica a minha casa). Se tiver essa sorte, mas o pescador não lhe entregar o peixe limpo, você terá que encarar algumas etapas, que não são difíceis, mas fazem um pouco de sujeira e demandam alguns cuidados: se for o caso, retire as escamas do peixe, raspando no sentido contrário com o lado não cortante de uma faca ou com um apetrecho especial para essa função; depois abra a barriga de ponta a ponta e retire as vísceras; levante as abas que ficam próximas da cabeça e, com cuidado para não se machucar, puxe e descarte as guelras (que dão um gosto amargo aos peixes cozidos ou assados inteiros); para descartar a cabeça, siga a linha diagonal da abertura das guelras; se quiser retirar os filés, use uma faca para filetar bem afiada (que tem uma lâmina muito fina e flexível) e, a partir da cabeça e seguindo o mais perto possível a coluna e as espinhas grandes, até chegar à ponta do rabo, solte o filé de um lado e depois o do outro (se o filé for grosso, pode ser dividido em porções individuais, tiras largas de 120 a 200 g); se for um peixe grande e roliço, ele pode ser cortado em postas (que são aquelas rodelas grossas, abertas na altura da barriga e com o osso da coluna no centro); se quiser mesmo descartar a pele, que sempre protege a carne, faça um cortezinho perto do rabo, levante essa pontinha com uma das mãos e, com a outra, siga soltando a pele com a faca de filetar, procurando trazer a menor quantidade possível de pedacinhos da carne com ela. Com um pouco de paciência e usando uma pinça, retire as espinhas, que costumam ficar alinhadas, ou faça como em muitos restaurantes: com delicadeza para não desperdiçar carne demais, faça dois cortes em “V”, um de cada lado da linha das espinhas, com a lâmina da faca na diagonal para que se encontrem logo abaixo da base das espinhas e seja possível retirar a fileira toda de uma vez. Guarde as carcaças e cabeças para um caldo, que é sempre útil e saboroso (e se quiser deixar essa função para um outro dia, é só congelar as carcaças bem lavadas). Lave e seque bem o peixe antes usar.Tem gente que acha que preparar um peixe é difícil, ou não faz idéia de como escolher e comprar, ou diz que não há um bom peixeiro por perto, ou tem pavor de espinhas, ou até compra um peixinho de vez em quando, mas sempre o mesmo. O fato é que o nosso litoral é imenso e, com tanto peixe bom, é uma bobagem só pensar em peixe na sexta-feira (e olhe lá!) e, se o ideal é comer um peixinho pelo menos 2 ou 3 vezes por semana, não há motivo para ficar só nos filezinhos de pescada ou merluza e nas postas de cação. Dá para variar, e muito, é só querer começar a experimentar.Existem peixes de carne muito branca, macia, leve e suave, que quase se desmancha de tão cremosa, outros de carne mais amarelada, acinzentada ou avermelhada, alguns mais oleosos e com um sabor mais pronunciado, outros que são muito firmes e não se desmancham com tanta facilidade, por isso são perfeitos para ensopados ou para grelhar na churrasqueira, uns são bem achatados e fininhos (como o linguado), outros são bem roliços. Para mim, o rei é o robalo, que é delicioso, com uma carne alvíssima e macia, com poucas espinhas, que vai bem com tudo e fica perfeito assado, cozido, grelhado ou frito; há o linguado, com os filés fininhos e largos, de carne muito branca e delicada, e que ficam divinos quando dourados na frigideira; as pescadas e pescadinhas branca, amarela e cambucu, que são sempre uma boa opção, tanto pelo sabor, como pelo preço; o badejo, bem branco e mais firme; o namorado, que dá ótimos filés e postas e fica bom de qualquer jeito; a corvina, de carne clarinha e muito macia, com filés bons para fritar ou cozinhar no vapor; o cação, que é um tipo de tubarão, bem popular, com postas brancas que ficam gostosas quando fritas ou ensopadas (só não cozinhe demais, pois ficam borrachentas); o cherne, com poucas espinhas e filés bem altos de carne bem alva; a garoupa, que dá postas ideais para assar ou grelhar (é só tirar as espinhas); o pargo, com a pele e a carne mais rosadas, filés não muito grandes e bons para fritar ou assar; o vermelho, que é avermelhado por fora, mas tem a carne bem branca, firme, com espinhas fáceis de tirar, e vai bem frito ou ensopado; a trilha, bem vermelhinha, que dá uns filezinhos bem saborosos; o atum, com aquele lombo maravilhoso (ficam deliciosos os filés altos deixados por meia hora numa marinada oriental e dourados bem rapidinho na frigideira ou na grelha, só por uns 2 ou 3 minutos de cada lado para continuar bem rosado por dentro, se quiser com uma crostinha de gergelim); o bonito, que também é saboroso e lembra o atum em sabor e textura; o congro, bom em filés; o mero, em filés ou inteiro; o dourado, em postas ou filés; o peixe espada, para preparar inteiro ou em postas; a tainha, que assada e recheada enfeita qualquer mesa, mas que também pode ser cozida; a anchova, que aparece em muitas receitas mediterrâneas e orientais (grelhadas com shoyu ou em conserva adocicada); a cavala e a cavalinha, com a carne um pouco mais acinzentada, bem saborosa e quase sem espinhas; a sardinha, que é baratissima e bem gostosa frita ou em conserva; a manjubinha, para fritar inteira, com cabeça e tudo e servir como petisco; a arraia, com as duas camadas de carne ficam dos lados da cartilagem das asas laterais e que se desmancha em fios grossos, muito brancos e saborosos (cozinhe no caldo ou vapor por uns 10 ou 15 minutos, ou no forno, depois regue com azeite, manteiga ou use numa salada).Para comprar o seu peixe numa peixaria, basta ficar atento a alguns pontos. O cheiro do peixe diz quase tudo, se ele não é bom, o gosto também não deve ser (se o cheiro é forte, desagradável, ou lembra amoníaco, isto quer dizer produtos químicos e decomposição, e lixo é a solução). O bom peixe tem um cheiro leve e fresco do mar. Os olhos devem estar bem abertos e vivos, embora algumas espécies naturalmente fiquem com os olhos ligeiramente embaçados quando morrem. A carne deve ser firme, nunca molenga ou borrachenta, deve ter um brilho leve, jamais opaca, triste, seca, quebradiça ou com reflexos arco-íris. Se pressionar a carne com a ponta do dedo, ela deve afundar um pouquinho e voltar. As guelras devem ser vermelhas, nunca esverdeadas ou amarronzadas (mas há uns malandros que dão uma tingidinha para tentar tapear ...).Para conseguir verificar se o peixe está bom, ou não, com mais facilidade e segurança, escolha e compre o seu peixe inteiro e depois peça ao peixeiro para limpar e cortar como você quiser. Só arrisque comprar filezinhos prontos se estiverem bem firmes e brilhantes e a peixaria for de muita confiança. Os filezinhos são sempre muito práticos, permitem que se prepare uma refeição em minutos (desde que estejam bem sequinhos, eles douram muito rápido numa frigideira ou num forno quente - se estiverem com pele, comece por esse lado para que não encolham e fiquem curvos).O ideal é comprar e consumir tudo o que vem do mar o mais rápido o possível. Ao chegar em casa, leve o peixe à geladeira (se o calor for grande, mantenha sobre gelo, mas não cubra com gelo para que o frio não queime a carne, que é muito delicada). Só congele em casa peixes muito frescos (confira com o seu fornecedor se o peixe que você comprou pode ser congelado) e embale muito bem (tanto para evitar que o cheiro de peixe se espalhe pelo freezer, como para que o frio não queime a carne). Se a sua peixaria for realmente boa e você tiver planos de passar uma temporada na praia, calcule o que pretende consumir, compre tudo, congele e vá descongelado e usando como e quando quiser. Para descongelar, com umas 12 horas de antecedência, passe o peixe do freezer para a geladeira (não deixe descongelar em temperatura ambiente, principalmente se estiver muito quente e evite mergulhar o peixe numa bacia com água para agilizar o processo, a não ser que esteja muito bem embalado).Os peixes são muito versáteis e se adaptam a mil e uma receitas. Pode ser um filezinho simplesmente passado na farinha com sal (se quiser, coloque pimenta, especiarias, ervas desidratadas, um pouco de parmesão) e dourado na frigideira no azeite ou na manteiga (nada como uma frigideira antiaderente, na verdade o ideal é ter 2, uma pequena e uma grande, e para que a pele não grude, aqueça bem a gordura, coloque o peixe na frigideira primeiro do lado da pele – assim ele não fica encurvado - depois abaixe o fogo para que ele tenha tempo de cozinhar por dentro sem queimar por fora). Filezinhos e peixinhos miúdos inteiros, como sardinhas e manjubinhas, também ficam ótimos empanados com uma massinha leve e fritos em bastante óleo, até dourar um pouco.Filés e peixes inteiros pequenos ficam deliciosos, macios e super saudáveis quando preparados no vapor. Postas, tiras mais largas ou cubos de peixe mais firmes vão muito bem nos ensopados (é só ter cuidado para o caldo do cozimento não ferver, só bolhinhas leves, e o peixe não passar do ponto e virar borracha).Peixes inteiros e filés mais grossos são perfeitos para assar, num tempo bem curto eles ficam ligeiramente dourados por fora, macios e úmidos por dentro (asse num forno forte, faça cortes diagonais na superfície do peixe, regue com limão e azeite, polvilhe com sal, coloque umas ervas na cavidade e pronto).Tanto um peixe inteiro, como um filé bem carnudo e mais firme, como camarões, polvos e lulas ficam o máximo quando preparados na grelha. Todos essas coisas do mar são opções muito saudáveis, leves e gostosas para o churrasco de sempre. Para que tudo corra bem, o primeiro passo é escolher um peixe que tenha uma carne mais firme, como o badejo, o atum, o salmão, mesmo um roblao ou namorado, mas nem pense num linguado, que tem uma chance enorme de se despedaçar em mil lasquinhas. Pense em manter a pele do peixe, que é importante tanto para evitar que a carne resseque, como para ajudar a manter tudo unido, sem se despedaçar. Como, mesmo os peixes mais firmes, são frágeis e podem se quebrar na hora de virar ou tirar da grelha, a melhor coisa a se fazer é providenciar uma grade especial: como o peixe fica fechado dentro de uma espécie de gaiola, feita de 2 grandes ligeiramente arredondadas, ele pode até dar uma quebradinha, mas nada se perde ou cai pela churrasqueira, recolher pedaços é muito simples. Um pouco de azeite, ou uma marinada que leve um pouco de óleo, mas que não seja forte demais para mascarar o sabor natural do peixe, além de incrementarem o sabor, ajudam a manter a carne mais úmida. Numa grelha já bem quente, um filé de uns 2 ou 3 cm de espessura leva de 5 a 10 minutos para dourar de cada lado e ficar pronto (depois disso, começa a ressecar e perde a graça).Camarão é camarão, sempre faz sucesso e dá um ar de festa e de praia a qualquer mesa, mas merece cuidados. Além de fresco, precisa estar bem acondicionado sobre gelo, com textura bem firme, casca durinha e com aparência crocante, nunca molenga como se fosse de plástico ou de papel. Como o camarão congela muito bem e, na geladeira, ele não dura tanto tempo, eu sempre prefiro comprar de uma peixaria que já tenha os camarões bem resfriados e congelar várias bandejas, de uns 500 g cada uma e de tamanhos diversos (deixo descongelar durante a noite na geladeira e, assim, não corro grandes riscos) para usar quando quiser. Por falar em tamanho, a classificação comum leva em conta o número médio de camarões por kg, ou seja, 1 kg do miudinho – 7 barbas – ideal para recheios, bom para misturar num arroz ou numa salada, ou para fritar com a casquinha e tudo e servir com uma cerveja, costuma ter uns 70; um kg de camarão médio, do branco, cinza ou rosa, vem com uns 30; o do grande tem entre 20 e 25; o do bem grande de 11 a 15; e o do pistola, que é aquele enorme, vem com uns 10. Uns preferem o rosa, outros o branco ou cinza (que é o tipo exportação, criado nas fazendas de Santa Catarina e do Ceará), e às vezes ainda aparecem uns mais avermelhados e uns tigrados, com riscas escuras. Descascar ou não o camarão é uma coisa que vai depender da receita escolhida e do grau de informalidade da refeição, pois nem sempre todos gostam da trabalheira ou tem habilidade de descascar na mesa, mas as cascas são importantes para proteger a carne na grelha, embora o processo leve no máximo uns 10 minutos. Principalmente para as receitas que pedem camarões grandes para servir com um molhinho, uma boa saída é deixar só a pontinha do rabinho, que além de dar um visual mais atraente, deixa o camarão mais firme de segurar. Tirar as tripas escuras é uma coisa que eu faço mesmo, apesar de ter gente famosa que diga que não se importa, que não há nada de mais em comer tudo (com a pontinha de uma faca bem afiada faça um cortezinho bem superficial seguindo a linha escura da tripa, puxe para soltar, lave e seque). Camarões vão bem nas receitas mais variadas e ficam deliciosos num tempo muito curto, pois quando cozinham demais e passam do ponto eles também viram borrachinhas (normalmente, quando ficam opacos e mudam de cor eles já estão cozidos e prontos, com a carne suculenta e macia; se quiser dar uma douradinha, mantenha o fogo forte para que tudo aconteça bem rapidinho). Principalmente para entrar nas saladas, use e abuse dos camarões cozidos no vapor, com umas ervas e um pouquinho de vinho branco (ficam bem melhores do que quando simplesmente cozidos na água com sal). Se a pressa for grande, e a despensa estiver vazia, aqueça um pouco de azeite numa frigideira grande, junte os camarões e deixe dourar um pouco em fogo alto, depois acrescente alho e salsinha bem picadinhos, sal, pimenta, misture bem e sirva com arroz.Eu adoro vieiras, acho uma delícia aquela carne branquinha, branquinha e bem tenra. Existem vieiras de vários tamanhos, desde as menores (umas 40 por kg) até umas chilenas imensas (umas 15 por kg). Dependendo da receita, sirva dentro da própria concha, que é linda, com ou sem o coral, que tem um sabor bem pronunciado, mas tem os seus admiradores. Como são muito delicadas, elas cozinham muito rápido e, se passarem do ponto, endurecem e perdem toda a graça. Por isso, para que elas dourem ligeiramente por fora, mas continuem macias por dentro, e não juntem água (aí elas começam a cozinhar no líquido em vez de dourar), o importante é esquentar bem a frigideira, depois juntar o azeite ou a manteiga, esperar aquecer também, acrescentar as vieiras e deixar dourar, no máximo, por uns 2 minutos de cada lado.Quem tem a sorte de encontrar mariscos bem frescos pode fazer uma refeição apetitosa: lave muito bem uns 3 kg de marisco (dependendo do espírito da refeição, calcule de 500 g a 1 kg por pessoa, o que pode parecer muito, mas não é, pois as conchas pesam demais e, carne mesmo, é bem pouco), esfregue as conchas com uma escovinha para retirar cracas, puxe as barbinhas com uma faca pequena e lave em água corrente (use no máximo em 24 horas, pois nunca se sabe por quanto tempo eles já estão rodando por aí; e como são bichinhos vivos, mantenha na parte mais baixa da geladeira, numa tigela sem água coberta com um pano, jamais em sacos plásticos, pois aí eles morrem sufocados). Numa panela bem grande, doure na manteiga ou no azeite 1 cebola, uns 2 dentes de alho e uns 2 talos de salsão, junte umas 2 xícaras de vinho branco ou cerveja, um amarradinho de ervas, espere ferver, adicione os mariscos, tampe a panela e aguarde de 3 a 5 minutos, apenas o bastante para abrir as conchas. Descarte os mariscos fechados, passe o caldinho por uma peneira para descartar grãozinhos de areia, volte ao fogo para reduzir um pouquinho e, se quiser, engrosse com um tiquinho de creme de leite fresco (nem precisa de sal, pois o caldinho já fica naturalmente salgado). Faça como os belgas e franceses, use a casca do primeiro marisco como pinça para tirar os demais das suas cascas e sirva com uma bela porção de batatas fritas.Depois vêm as lulas e polvos, que têm todo o ar misterioso dos monstros e outras criaturas do mar e, há milênios, fazem parte de lendas e mais lendas. Muita gente pensa que as lulas são pequenas e os polvos gigantescos, como aparecem em filmes, mas, na realidade, os polvos são menores e as lulas, elas sim, podem ser bem miúdas ou gigantescas e com tentáculos imensos.Se precisar limpar uma lula, não se aflija, pois a tarefa é simples: segure o corpo com uma das mãos e, com a outra, puxe a cabeça com os tentáculos, que se soltarão junto com o saquinho de tinta; aperte a cabeça com a ponta dos dedos e sairá de dentro dela uma bolinha bem dura, então puxe a bolinha e descarte (se for preciso, use a ponta de uma faca para ajudar a soltar); para esvaziar o corpo, puxe as entranhas com a mão e elas sairão com facilidade (virão o esqueleto central, que parece uma carga de caneta de plástico duro e umas melequinhas bem inofensivas - algumas receitas mediterrâneas pedem para deixar umas 2 ou 3 lulas com esse caldinho amarelado para ajudar a ligar e a dar mais sabor ao molho); puxe e descarte a pele arroxeada (não se preocupe se não sair tudo, pois tirar ou não é uma questão bem estética); corte as abas laterais e pique para usar num ensopado; dependendo da receita, deixe o cone do corpo inteiro ou corte em anéis e guarde os tentáculos inteiros, já que eles enfeitam o prato. A carne da lula é branquíssima, bem firme, saborosa, muito saudável, mas, para ficar gostosa e macia, depende de alguns cuidados de cozimento: na verdade, ou se cozinha uma lula por alguns pouquíssimos minutos, ou por mais ou menos 1 hora. Jogada numa frigideira bem quente ou numa grelha, com o fogo bem forte, a lula doura bem rapinho primeiro de um lado, depois do outro e perde o gosto de cru (não fica molinha, se desmanchando, mas fica macia e deliciosa), e o mesmo acontece se ela for simplesmente mergulhada num caldo fervente por uns 2 minutos, só até mudar de cor e de textura, escorrida e resfriada (perfeita para ser usada numa salada). Passados esses primeiros minutos, a lula enrijece totalmente, pede um líquido e mais ou menos 1 hora de cozimento num fogo mais baixo, até cozinhar e amaciar de vez (aí sim, ela fica bem molinha, mas não deve também cozinhar demais, pois começa a secar e perde o sabor).Uma lula recheada com um refogadinho feito dos próprios tentáculos picadinhos com alho, cebola, ervas, pão, e cozida no azeite e vinho branco fica boa demais. O importante é ter o cuidado de preencher só uns ¾ do corpo da lula com o recheio, pois ela encolhe com o cozimento e se estiver muito estufada vai estourar. Também fica apetitosa a lula dourada no azeite com cebola, alho, tomate, regada com um pouco de vinho branco, água o bastante para cobrir, um amarrado de ervas, e cozida em fogo baixo, com a panela tampada, por mais ou menos 1 hora (se quiser, junte arroz cru, que cozinha no caldo da lula e fica muito saboroso), com um pouco de salsinha e de azeitona no final.Uma porção de lulas fritinhas e bem secas, com uma cerveja ou uma caipirinha, costuma ser irresistível, é difícil quem não goste, até as crianças costumam adorar. Há quem polvilhe as lulas com sal e pimenta, quem regue com suco de limão ou cachaça para amaciar, mas, independentemente da sua escolha, o fundamental é escorrer bem e secar os anéis e tentáculos antes de passar tudo pela farinha temperada com sal e pimenta (chacoalhe bem para descartar o excedente de farinha), ou pelo fubá (que deixa uma casquinha mais rústica) ou pelo ovo batido e depois pela farinha (fica uma massinha mais macia), ou de mergulhar numa massa leve (misture ½ xícara de farinha, 1/3 de xícara de maisena, 1 gema, ¾ de xícara de água, 1 colher de sopa de óleo e 1 colher de chá de fermento em pó). Em seguida, é só fritar em óleo quente e abundante por uns 2 ou 3 minutos, até que os anéis estejam bem sequinhos, crocantes e dourados, escorrer sobre papel absorvente e servir com um limãozinho, um molho tártaro ou algum outro que você achar interessante. Ah, normalmente, numa refeição, uma porção de lula para uma pessoa tem uns 250 g e, como petisco, 1 kg de lula limpa costuma dar para umas 6 pessoas.O polvo é um bicho interessante, pois muita gente gosta, mas tem medo de não saber comprar e cozinhar, alguns dizem que não gostam – mas, como acontece com criança, às vezes nem chegaram a ter coragem de experimentar – e, quando experimentam, muitas vezes se surpreendem e adoram (ou não gostam, mas pelo menos provaram), outros têm a maior curiosidade, mas nem ousam passar por perto. Ele é meio molenga, tem uma cabeça central (que é mesmo um pouco feiosinha, mas que, sem a pele e fatiada, vai muito bem no meio de uma salada, de um molho ou do arroz) e 8 tentáculos cheios de ventosas, com uma aparência bem interessante, tudo coberto com uma pele lisa, brilhante e arroxeada (se a pele estiver amarronzada e sem brilho, nem pense em comprar). Nas peixarias, normalmente se acha o polvo comum, pesando entre 2 e 3 kg (um polvo de uns 2 kg cru fica com uns 500 g depois de cozido), e o baby, que é muito macio e costuma pesar por volta de 400 g (calcule 1 por pessoa, pois cozido ele fica com uns 150 g) que é bem macio e cozinha rapidinho. Se tiver que encarar um polvo inteiro, retire o bico, desvire a cabeça como se fosse uma meia e descarte o saco de tinta e os outros órgãos que estiverem lá dentro, depois lave bem (não é difícil, mas é mais fácil comprar o polvo limpo).Como eu queria achar um método de cozimento que fosse simples e resolvesse, desse um polvo bem macio e saboroso, parti para os meus mil testes e confesso que me diverti com o assunto. Para deixar a carne macia, dizem que os pescadores gregos costumavam bater o polvo numa pedra umas 90 vezes; por aqui, ainda é comum bater umas 10 vezes com a tábua de carne; e os japoneses amassam os tentáculos numa tigela com nabo ralado, como se estivessem sovando um pão. Testei um método grego que pedia para cozinhar o polvo só com um pouco de vinho, louro e sal numa panela tampada (assim também acontece na Córsega e outros lugares no Mediterrâneo, às vezes ainda acrescentando açafrão, erva-doce, pimenta, tomates, orégano, manjericão, além do azeite, da cebola, do louro, do alho e do vinho branco ou tinto de sempre, e, se for o caso, juntando um pouco de água e arroz cru nos últimos 20 minutos); um japonês que dizia para cozinhar o polvo num chá verde bem concentrado; um outro japonês que falava para cobrir o polvo inteiro com sal, deixar repousar por 1 hora, e então cozinhar por 10 minutos nuns 3 litros de água fervente e 1 xícara de vinagre de arroz; um espanhol que sugeria mergulhar e retirar um polvo espetado num garfo na água fervente salgada por 5 vezes, depois mergulhar de vez na água; e simplesmente cozinhar o polvo em fogo baixo na água (há quem use até água do mar, aí nem é preciso salgar) e vinho branco, legumes aromatizantes e ervas, retirando sempre a espuma que subir. Tirando o japonês que falava para deixar o polvo na panela por 10 minutos, todos diziam que, dependendo do tamanho, um polvo levaria mais ou menos 1 hora e meia para ficar bem macio e, que, para testar, o mais simples é espetar um tentáculo com um garfo. Depois de cozido, é só descartar o excedente de pele meio mole, principalmente da parte da cabeça, e usar o polvo como quiser, ou deixando inteiro para grelhar na churrasqueira ou dourar no azeite numa frigideira, ou cortando em pedacinhos do tamanho de uma mordida para usar numa salada ou num molho (se quiser, cozinhe o polvo na véspera e guarde na geladeira; e use o caldo do cozimento para preparar um pouco de arroz bem saboroso).De todos, eu gostei bastante do grego, que fica com o sabor acentuado do vinho, do japonês do chá verde, que fica com uma cor e uma textura interessantes, e do espanhol, que fica muito macio e gostoso. Qualquer um dos 3 vale a pena. Sinceramente, não achei que os aromatizantes do método mais tradicional acrescentaram algum sabor ao polvo, e o japonês do sal e do vinagre também não ficou muito macio.Vamos às receitas. Pensando em aperitivos e entradinhas, mas que podem perfeitamente fazer parte de uma refeição, vão três receitas: o Ceviche de peixe, como se faz no México, Peru, Chile e outros países da América Latina que dão para o Pacífico, sempre gostoso e refrescante com o azedinho do limão e da laranja que cozinham o peixe naturalmente (o fundamental é usar peixe muuuuiiiiittttitooo fresco); o Atum fresco em conserva no azeite de oliva e ervas, super interessante, gostoso e versátil, para comer com pão ou entrar numa salada ou numa massa; e a Terrine de camarões, iogurte, endro com saladinha de tomate, que, além de gostosa, enfeita qualquer mesa. Como praia e verão têm tudo a ver com saladas mais substanciosas, que possam cumprir o papel de prato único, escolhi 5 receitas, as 2 duas primeiras verdadeiros clássicos do sudeste asiático: a Salada asiática de frango, legumes, lámen e molho de amendoim, super saborosa e cheia de contrastes entre o salgadinho e o adocicado (sugeri assar o peito de frango, pois acho que fica bem melhor do que cozido, mas nada impede que se aproveite sobras ou outros pedaços do frango, até mesmo de filés de peito dourados na frigideira, ou se troque por camarões cozidos); e a Thai beef salad, que sempre arranca suspiros com as tirinhas de filé-mignon marinadas no limão, alho, gengibre, capim-limão, coentro, hortelã e misturadas aos tomatinhos, pedacinhos de pepino e ao harusame, aquela massa finininha e transparente. Depois vêm duas saladas com grãos, que eu gosto de preparar para o lanche da noite, a Salada de cevadinha, tomates, mussarela de búfala e manjericão, uma combinação que é sucesso na certa, e a Salada de frango, arroz selvagem, damasco e ervas, muito apetitosa e interessante com os contrastes da textura do arroz, o docinho do damasco, o sabor do salsão e das ervas (se gostar, use mesmo o coentro, pois ele faz a diferença). A quinta é uma Salada de polvo, que é muito boa e, ao contrário do que muita gente pensa, não é nenhum bicho-de-sete-cabeças, já que respeitadas as técnicas de cozimento, o polvo fica super macio, saboroso e nada borrachento. Para uma refeição mais alternativa, descontraída, colorida e refrescante, imaginei a Tigela mexicana: a salsa de tomate, o frango, as tortillas e os acompanhamentos todos ficam espalhados pela mesa e cada um monta a sua tigela como quiser (as tortillas feitas em casa são deliciosas, mas nada impede que se compre um pacotinho no supermercado se a pressa ou a preguiça falarem mais alto.Aí chegam os peixes (sugeri robalo, linguado, pescadinha, badejo, mas é só substituir pelo peixe que preferir), o primeiro deles o Robalo assado com misô, simples e fácil até onde pode ser, bem gostoso e que, com o Arroz oriental, resolve um almoço bem rapidinho. Depois vem o Papillote thai de linguado e legumes, prático e delicioso, pois as tirinhas de peixe, os legumes e a massa oriental, temperados com gengibre, alho, limão, capim-limão, molho de peixe e pimenta, vão juntos para o forno dentro de um pacotinho, para ser aberto na mesa, espalhando um aroma delicioso. O Filé de pescada à siciliana, que sempre agrada, com ingredientes bem saborosos, perfumados e coloridos, como eu adoro, pode ser servido quente, mas frio fica até melhor e pode ser guardado por umas 24 horas na geladeira (embora muita gente torça o nariz – e muitas vezes por pura implicância - , a receita também pode ser feita com filezinhos já bem limpos e sem espinhas de sardinha, que levam de 5 a 10 minutos no forno; aliás, sardinhas também ficam divinas simplesmente douradas no azeite com alho e ervas numa frigideira, misturadas a cubinhos de tomate, alcaparras e deixadas na geladeira para marinar por pelo menos umas 8 horas para servir com um pão bem rústico ou entrar num molho para massa). Vem, então, a Caçarola do mar com couscous marroquino, aquele prato único que tem tudo a ver com praia, fica o máximo com o gostinho e o perfume da laranja, que deixam o ensopado de peixe e lula realmente especial (o caldo e o ensopado podem ficar prontinhos na geladeira, ficando só aquecer e hidratar o couscous na hora de servir). O Crumble de vieira sempre impressiona, e é uma boa saída quando se tem um convidado especial (se quiser, troque a vieira por peixe ou camarão).A dobradinha coco e camarão aparece mais de uma vez, mas em versões bem diferentes, e todas tentadoras: nos Pacotinhos jamaicanos de camarão, banana e coco, lindinhos e deliciosos, além de bem diferentes e surpreendentes, pois o mistério sempre fascina (e falta de folha de bananeira não serve de desculpa, pois dá para fazer a mesma coisa com papel alumínio ou manteiga); no Curry thai de camarão e abacaxi, rapidíssimo e muito saboroso, que só pede um arroz branco para acompanhar, de preferência de jasmim ou basmati; e na Moqueca de camarão com pirão e arroz de coco, super Brasil, apetitosa e nada complicada de fazer, já que uma boa moqueca pede que tudo vá para a panela de uma vez, o pirão fica pronto em no máximo 45 minutos e o arroz é sempre rapidinho.E para que não digam que só pensei nas coisas do mar, imaginei um almoço preparado na churrasqueira com um trio de espetinhos: os Kebabs de cordeiro com especiarias e molhinho de iogurte e hortelã; berinjela, queijo e tomatinhos; e de batatinha e alecrim.Para a hora da sobremesa, sugeri o Gelado de frutas vermelhas, que sempre refresca e pode ser feito com qualquer fruta que estiver dando sopa pela cozinha; e a Goiaba com farofa crocante de castanha-do-pará, que ficou demais de boa – e num piscar de olhos - para servir com uma bola de sorvete de creme ou de iogurte.

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